A agricultura é um dos setores que mais sofrerá os impactos das alterações climáticas. Como seria de esperar, a produção agrícola dos países em desenvolvimento será muito afetada empurrando milhões de pessoas para situações de carência nutricional ou fome.

Há poucos dias o professor Richard Muller, físico da Universidade de Berkeley e um dos últimos cientistas de renome que levantava dúvidas em relação às Alterações Climáticas e à importância da ação humana no aquecimento global, reconheceu que está definitivamente convencido que o fenómeno é real e que as emissões humanas de gases GHG são a principal causa. Utilizando dados recolhidos no âmbito do projeto “Berkeley Earth Surface Temperature”, o cientista concluiu que a temperatura média à superfície da Terra aumentou 1,5º C nos últimos 250 anos.

Numa altura em que caem alguns dos últimos pilares do castelo de cartas que os céticos das alterações climáticas construíram, convém salientar que uma das atividades humanas mais dependentes do clima é a agricultura (sobretudo a agricultura tradicional, que evoluiu ao longo de gerações adaptando-se às características de cada local - incluindo o clima - para hoje em dia continuar a alimentar uma enorme percentagem da população mundial). Talvez seja uma boa altura para relembrar alguns dos principais impactos na agricultura mundial no ano de 2050, antecipados por diversos modelos de previsão das alterações climáticas:

  • Redução significativa das colheitas de arroz, milho e trigo nos países em desenvolvimento (sobretudo no Sul da Ásia e África Subsariana). Esta redução poderá ultrapassar os 40% para alguns casos críticos, por exemplo, para o trigo na Ásia, ou 30% para o trigo na África subsariana. Estas reduções são calculadas em relação aos valores expectáveis num cenário sem alterações climáticas.
  • Aumento dos preços dos bens alimentares. Apesar de ser expectável que os preços dos bens alimentares continuem a subir mesmo num hipotético cenário sem alterações climáticas (o aumento da população, a evolução do poder de compra, pressão dos biocombustíveis, entre outros fatores conduziram inevitavelmente a um aumento do preço), as alterações climáticas levarão a um aumento extra que variará entre os 10% (soja) e os 110% (trigo). Este aumento também terá impacto nos produtos de origem animal (aumentos suplementares de mais de 20%).
  • Mudança dos padrões de consumo alimentar, com manutenção da dependência direta dos cereais nos países em desenvolvimento.
  • Estes três impactos acabam por conjugar-se e resultar numa redução efetiva das calorias disponíveis (e ingeridas) por cada consumidor. Isto é especialmente evidente e grave nos países em desenvolvimento. É de esperar que em 2050, cada habitante dos países em desenvolvimento tenha acesso a menos 10% das calorias que tinha no ano 2000. 

Independentemente dos elevados custos económicos associados a uma transição para uma agricultura de baixo carbono e resiliente às alterações climáticas, convém sempre ter em consideração que o “Business as usual” terá custos económicos e humanos muito superiores...

É necessário agir já.

Nota: os dados citados vêm do relatório “Climate Change - Impact on Agriculture and Costs of Adaptation” do IFPRI (International Food Policy Research Institute).